O dogmatismo milenar vem mantendo a relação entre a fé e a razão algo no mínimo curioso, visto que ter fé deveria significar: crer, acreditar, saber, confiar etc., em algo que se pudesse pelo menos encontrar argumentos que os justificassem a luz de uma análise mais profunda, e não, como a grande maioria de seus seguidores demonstra, aceitando sem qualquer cuidado em verificar se essa fé se fundamenta em algo aceitável por qualquer inteligência mediana, visto que para se crer em alguma coisa, é necessário que se acredite na existência dessa coisa.
A fé que o Espiritismo nos prega está fundamentada no trabalho grandioso de estudo e pesquisa, empreendido na confecção dos postulados nos quais se fundamenta a Codificação Espírita, nascida da observação dos fatos, da análise minuciosa de cada situação acontecida, observada, comparada e conferida à luz da razão, em seus mínimos detalhes, pelo insigne codificador através do raciocínio e sob a orientação dos Espíritos Superiores, constituindo-se, por isso mesmo, em argumentos tão lógicos que nos levaram a desenvolver a fé que hoje denominamos de “Fé raciocinada”.
“… A fé sincera é empolgante e contagiosa; comunica-se aos que não na tinham, ou, mesmo, não desejariam tê-la. Encontra palavras persuasivas que vão à alma. Ao passo que a fé aparente usa de palavras sonoras que deixam frio e indiferente quem as escuta. Pregai pelo exemplo da vossa fé, para a incutirdes nos homens. Pregai pelo exemplo das vossas obras para lhes demonstrardes o merecimento da fé. Pregai pela vossa esperança firme, para lhes dardes a ver a confiança que fortifica e põe a criatura em condições de enfrentar todas as vicissitudes da vida.
Tende, pois, a fé, com o que ela contém de belo e de bom, com a sua pureza, com a sua racionalidade. Não admitais a fé sem comprovação, cega filha da cegueira. Amai a Deus, mas sabendo porque o amais; crede nas suas promessas, mas sabendo porque acreditais nelas; segui os nossos conselhos, mas compenetrados do fim que vos apontamos e dos meios que vos trazemos para o atingirdes. Crede e esperai sem desfalecimento: os milagres são obras da fé. – José, Espírito protetor. (Bordéus, 1862.) (1)
Isso significa dizer que, não devemos apenas aceitar seus argumentos, seus estudos e pesquisas sem nos determos em uma análise sob nossa própria ótica, utilizando a bênção da inteligência de que somos portadores. Chama-nos a atenção afirmando que: “Fé inabalável só o é a que pode encarar frente a frente a razão em todas as épocas da humanidade”. (2)
A própria Doutrina Espírita esclarece que não devemos, simplesmente, aceitar os conceitos contidos na codificação sem uma análise fria e detalhada do que ela contém, dando-nos o direito até mesmo de ter nossas próprias dúvidas, pois é ela antes de tudo democrática, não é imposta a quem quer que seja, pois entende que muitas das coisas que não aceitamos hoje, por absoluto desconhecimento, amanhã tornar-se-á algo, perfeitamente, aceitável, em vista das descobertas da ciência, no desenvolvimento de outros mecanismos hoje desconhecidos.
Entendemos que é da saudável discussão que nascem as respostas mais próximas da verdade; no trocar de experiências, contribuindo cada qual com a fração de seus conhecimentos, contribuindo para uma melhor compreensão dos fatos por todos os seus participantes, pois não somos conhecedores de todas as áreas da ciência e sim, da área em que nos especializamos mais particularmente ou que exercemos nossas atividades profissionais etc.
Nós, Cristãos Espíritas, não podemos afastar por motivo algum, sob nenhum pretexto a faculdade de dialogar, não somente entre os seguidores da filosofia que abraçamos, mas, também com todos os nossos irmãos em humanidade, detentores de conhecimento da área filosófica ou científica, buscando constantemente o aperfeiçoamento a renovação o aprimoramento e a atualização de nossos conhecimentos, ampliando nossa visão do todo sem nos fechar na pretensão de sermos os únicos donos da verdade, para não repetir os erros de tantos quantos se enclausuraram na vaidade do saber tudo, tomando por base unicamente os dogmas aceitos pela fé cega de outrora.
Referências Bibliográficas:
(1) KARDEC, ALLAN. O Evangelho Segundo o Espiritismo – FEB, 112ª edição, cap. XIX, item 11;
(2) KARDEC, ALLAN. O Evangelho Segundo o Espiritismo – FEB, 112ª edição, cap. XIX, item 7.
(2) KARDEC, ALLAN. O Evangelho Segundo o Espiritismo – FEB, 112ª edição, cap. XIX, item 7.
Francisco Rebouças