Alguém houve na Terra
que nascido na palha não desesperou da pobreza a que o mundo lhe relegara a
existência, transformando o berço apagado em poema inesquecível.
Assinalado por uma
estrela em sua primeira hora humana, nunca se lembrou disso em meio das
criaturas.
Com a sabedoria dos
anjos, falava a linguagem dos homens, entretendo-se à beira de um lago em
desconforto, com as criancinhas desamparadas.
Trazendo os tesouros
da imortalidade no espírito, vivia sem disputar uma pedra onde repousar a
cabeça e dispondo da autoridade maior escolhia servir, ao invés de mandar, levantando
os doentes e amparando aos aflitos.
Em permanente contato
com o Céu, ninguém lhe ouviu qualquer palavra em torno dessa prerrogativa e
podendo deslumbrar o cérebro de seu tempo, preferia buscar o coração dos
simples para esculpir na alma do povo as virtudes do amor no apoio recíproco.
Esquecido, não se
descurava do dever de auxiliar sempre; insultado, perdoava; traído, socorria
aos verdugos, soerguendo-lhes o espírito através da própria humildade.
Golpeado em suas
esperanças mais belas, desculpava sem condições a quantos lhe feriam a alma
Angélica.
Amparando sem paga,
ninguém lhe escutou a mais leve queixa contra os beneficiários sem memória a
lhe zurzirem a vida e o nome com as farpas da ingratidão.
Vendido por um dos
companheiros que mais amava, recebeu-lhe, sereno, o beijo suspeitoso.
Encarcerado e
sentenciado, à morte sem culpa, não recorreu à justiça por amor àqueles que lhe
escarravam na face, deixando-se sacrificar com o silêncio da paz e o verbo do perdão.
E ainda mesmo depois
do túmulo, ei-lo que volta à Terra estendendo as mãos aos amigos que o mal
segregara na deserção, reunindo-os de novo em seus braços de luz.
Esse alguém era humilde.
Livro: Abrigo
Chico Xavier/Emmanuel
Francisco Rebouças