Entrai pela porta
estreita, porque larga é a porta da perdição e espaçoso o caminho que a ela
conduz, e muitos são os que por ela entram. - Quão pequena é a porta da vida!
quão apertado o caminho que a ela conduz! e quão poucos a encontram!
(S. MATEUS, cap. VII, vv.
13 e 14.)
Muitas
pessoas, até mesmo no meio espírita, interpretam ao pé da letra essa passagem
do evangelho de Mateus, sobre a porta estreita, por entenderem que o homem foi punido
pelo cometimento do pecado original, em desobediência aos desígnios de Deus, fazendo
por merecer esse justo castigo da perda do paraíso, o que exigirá da criatura grandes
esforços, para os suplícios e martírios com que Deus resolveu castigá-lo.
Continuam
com a velha e viciada visão do Deus cruel, vingador, irracível, que se vingava
de quem não cumprisse suas determinações, condenando o desgraçado por sua
desobediência a castigos dignos do mais violento e desumano carrasco terrestre,
sem levar em conta certas circunstâncias, como por exemplo, quando alguém
cometia algo contrário às suas Leis por pura ignorância, ou até mesmo por ter
aprendido com alguém de maneira errada, e proceder conforme o que conhecia;
pensamento esse, fruto do ensino religioso ultrapassado e sem coerência a que sempre
esteve submetido.
Dessa
forma, estaria o pobre coitado submetido à fúria cruel e irracional do “Deus”
que deveria ser seu pai amoroso e compreensivo dando-lhe exemplo de mansuetude,
paz, harmonia, amor, etc., etc., e que na verdade, não passa de alguém tão ou
mais violento e vingador quanto ele próprio. Para desfazer esse terrível
equívoco, a sabedoria divina nos enviou o Consolador Prometido por Jesus e, no Evangelho
Segundo o Espiritismo, desfrutamos da oportunidade sublime de aprender a ver e interpretar
essa mesma passagem de Mateus com ótica bem diferente.
Se nós
como pais, com a nossa acanhada visão espiritual, não aceitamos condenar um
filho nosso que tenha caído em erro, pois lhes concedemos sempre nova
oportunidade recuperar o erro cometido, e até mesmo assumimos muitos desses
erros, quitando o débito com o outro a quem nosso filho contraiu a dívida, para
não assistirmos sua desventura, quanto mais esse Pai criador de tudo e de
todos, detentor de todas as virtudes em grau absoluto.
Explicam-nos
os mensageiros da boa-nova, nessa incomparável doutrina dos espíritos, que é estreita a porta da salvação, porque a grandes esforços
sobre si mesmo é obrigado o homem que a queira transpor, para vencer suas más
tendências, coisa a que poucos se dispõem a fazer, e que é larga a porta da
perdição, porque são numerosas as paixões más que ainda trazemos arraigadas em
nosso espírito milenar, e por isso mesmo o maior número de criaturas envereda
pelo caminho do mal na hora que é chamado a escolher o caminho a trilhar
usando o seu livre arbítrio, e assumindo, portanto as consequências das suas
escolhas, representando para nós o complemento da máxima: "Muitos são
os chamados e poucos os escolhidos”.
Sendo a Terra mundo de expiação,
nela predomina o mal. Quando se achar transformada, a estrada do bem será a
mais frequentada. Aquelas palavras devem, pois, entender-se em sentido relativo
e não em sentido absoluto. Se houvesse de ser esse o estado normal da
Humanidade, teria Deus condenado à perdição a imensa maioria das suas
criaturas, suposição inadmissível, desde que se reconheça que Deus é todo
justiça e bondade.
Mas, de que delitos esta Humanidade
se houvera feito culpada para merecer tão triste sorte, no presente e no
futuro, se toda ela se achasse degredada na Terra e se a alma não tivesse tido
outras existências? Por que tantos entraves postos diante de seus passos? Por
que essa porta tão estreita que só a muito poucos é dado transpor, se a sorte
da alma é determinada para sempre, logo após a morte? Assim é que, com a
unicidade da existência, o homem está sempre em contradição consigo mesmo e com
a justiça de Deus. Com a anterioridade da alma e a pluralidade dos mundos, o
horizonte se alarga; faz-se luz sobre os pontos mais obscuros da fé; o presente
e o futuro tornam-se solidários com o passado, e só então se pode compreender
toda a profundeza, toda verdade e toda sabedoria das máximas do Cristo.
Nem todos
os que dizem: Senhor! Senhor! entrarão no reino dos céus.
No Capítulo
VI, do Evangelho Segundo o Espiritismo – O Cristo Consolador, João XIV, vv.15 a
17 e 26, o Espírito de Verdade, vem nos trazer os esclarecimentos que nos
faltavam a cerca do assunto afirmando-nos: “Mas,
ingratos, os homens afastaram-se do caminho reto e largo que conduz ao reino de
meu Pai e enveredaram pelas ásperas sendas da impiedade”.
Em vista de tantos esclarecimentos,
trazidos a lume pelo insigne codificador do espiritismo, através do trabalho de
implantação da verdade entre nós, realizado por Jesus e seus diletos
colaboradores da esfera mais alta da espiritualidade superior, para que
tenhamos conhecimento da verdade, pois só ela será capaz de nos libertar de
nossa secular ignorância, dediquemo-nos, a estudá-la com disposição, e sincera
intenção de apreender seus luminosos ensinamentos com disciplina e boa-vontade,
e certamente compreenderemos por fim, que Deus é manancial inesgotável de amor
em benefício de todas as suas criaturas.
Francisco
Rebouças.